No fim de fevereiro, muitos saíram à rua mascarados e não foi por razões sanitárias, foi para festejar o Carnaval. O que associamos à celebração do Carnaval mantém-se ao longo da história da humanidade, mesmo em culturas diferentes: alguma subversão da ordem social, momentaneamente e com o conhecimento de todos fingir-se aquilo que não se é, alegria eufórica e mascarada e festejos comunitários, com o posterior e inevitável regresso à rotina e à ‘normalidade’. O Carnaval, enquanto celebração, reflete como que uma suspensão da realidade, em que se pode experimentar aquilo que não se é, sob o olhar de todos os demais.
O Carnaval recorda-nos, assim, algo muitas vezes associado à saúde mental - as máscaras usadas para ocultar uma realidade desafiadora e frequentemente incompreendida. Porém, estas máscaras, ao contrário das usadas no Carnaval, não procuram ser diferenciadoras nem alegres, procuram que se consiga passar despercebido e percecionado como alguém ‘normal’. Na verdade, todos adaptamos o nosso comportamento de acordo com os diferentes contextos onde nos movemos e os diferentes papéis que desempenhamos. Somos a pessoa tímida que comunica eficazmente quando solicitado, a pessoa extrovertida que modera a sua resposta em situações mais formais e protocolares, a pessoa criativa que se ajusta a tarefas repetitivas para garantir o seu sustento ou a pessoa rígida e polida que dança efusivamente quando, num ambiente seguro, toca a sua música preferida. Estas respostas são saudáveis dado que refletem capacidade de adaptação e flexibilidade, revelando um repertório comportamental diversificado e funcional. Porém, esse esforço de adaptação pode não ser adequado se nos levar a ocultar a nossa condição em relação à saúde mental. Quando mascaramos a nossa situação, podemos estar a ocultar aquilo que não deve ser escondido, porque pode impedir ou adiar a ajuda para ultrapassar a situação e contribuir para o estigma em relação à doença mental. Nas últimas décadas, muitas doenças foram desmistificadas e aprendemos a falar delas publicamente, como é o caso do cancro. No entanto, em relação à doença mental, o estigma permanece. Continuamos a julgar, discriminar e culpar quem apresenta sintomas de doença mental. A incapacidade social de aceitar a pessoa com experiência de doença mental pode levar à utilização de máscaras sociais por parte desta, escondendo a sua condição e sofrendo em silêncio. Embora pareça ao próprio que a máscara em relação à sua saúde mental é protetora, mantê-la, ao longo do tempo, torna-se desgastante porque é concomitante com o desgaste provocado pela doença em si. Consome energia, dificulta a conexão com os outros e consigo próprio, necessária para ultrapassar situações difíceis, e aumenta o fosso entre o que o individuo transmite e a sua realidade interior. Retirar a máscara não é menos assustador e pode ser doloroso. Exige capacidade de se mostrar vulnerável, de ousar expor-se e de confiar nos à sua volta. Contudo, apresenta vantagens:
Permitir-se dizer “Estou cansada(o)”, “Estou triste” “Sinto-me só” “Estou a melhorar” “Sinto-me perdida” “Procurei ajuda e sinto algum alívio”, é retirar a máscara, baixar a guarda e poder respirar. Começar por escolher um local seguro onde se revelar pode ser o primeiro passo para o fim de uma vivência limitada e isolada. Permite também que todos percebamos que a cara da doença mental somos nós e pode ser a de qualquer um de nós. Juntos pela Saúde Mental de Todos Nós ManifestaMente, Raquel Monteiro Kipp, P. (2013, October 25). To Combat Stigma, Take Off Your Mask, HealthyPlace. Comments are closed.
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Novembro 2024
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