Britney saltou para a ribalta quando tinha apenas 16 anos. Viveu o final da adolescência, e início da vida adulta, sob o escrutínio atento de milhões de fãs e da imprensa que, na altura, conhecia poucos limites.
O seu álbum de estreia “Baby One More Time” foi dos primeiros CDs que tive. Não tinha ainda 6 anos e lembro-me de, ao mesmo tempo que aprendia as primeiras palavras em inglês, tentar ler as folhas que vinham dentro da caixinha que trazia o CD, muito longe de lhes conhecer o significado. No seu primeiro hit, Britney cantava sobre a solidão e a necessidade de ter alguém que lhe indicasse o caminho. Palavras premonitórias, quando todos estavam longe de imaginar o que seriam os seus anos seguintes. O seu sucesso foi estrondoso e, em 2004, casava com o dançarino Kevin Federline, quando tudo parecia correr bem. Mas a história de Britney daria uma volta de 180º quando, em 2008, depois de se ter divorciado, e ter sido internada num serviço de saúde mental por duas vezes, o seu pai, Jamie Spears, iniciava um complexo processo legal que a colocaria sob a sua tutela. A “conservatorship” é um recurso legal que é usado quando, por força de uma condição médica, a pessoa deixa de ser capaz de zelar por necessidades básicas como a sua alimentação, alojamento, gestão financeira e tratamentos médicos. É então nomeado um tutor legal que a representa, garantindo o seu melhor interesse, e defendendo os seus direitos. Não saberemos, nem nos cabe opinar, acerca da possibilidade de Britney sofrer de uma doença que comprometesse a sua capacidade de tomar decisões, de forma autónoma, e de gerir a sua vida,mas sabemos que foi mantida sob este regime durante treze anos - os mesmos anos em que trabalhou arduamente, lançando dois álbuns, fazendo espectáculos e digressões e gerando avultadas receitas. Algumas fontes referem que, por várias vezes, lhe foi vedado o acesso a um advogado escolhido por si, invocando a incapacidade para escolhê-lo e estabelecer uma relação cliente-representante adequada. Sabemos, também, que foi submetida a uma pressão que talvez nenhuma outra figura pública tenha vivido. Desde a cobertura constante de todos os seus passos, por paparazzi pagos a preço de ouro, a entrevistas onde eram feitas perguntas sobre a sua vida sexual e comentado o seu corpo sem a sua permissão, a todos os insultos de que foi alvo depois da separação de Justin Timberlake e do divórcio com Kevin Federline. Hoje, em 2022, pode parecer-nos inaceitável e até difícil de acreditar que se pergunte a uma artista se é virgem, se tem implantes mamários, ou é a culpada pelo final da sua última relação. Mas tudo isto era a realidade de Britney enquanto se descobria como pessoa. Pode parecer ainda mais surreal que, num conhecido concurso de talentos infantil - o Star Search, o apresentador, de 69 anos de idade, tenha perguntado a Britney, com apenas 10 anos na altura, se podia ser o seu namorado e, imediatamente a seguir, a outro concorrente perguntou como era crescer numa quinta. Anos mais tarde, numa entrevista, Britney disse sentir-se desconfortável com as perguntas que lhe estavam a ser feitas e, em lágrimas, pediu para interromper a gravação, o que não só não aconteceu, como a mesma acabou por ir para o ar sem qualquer filtro. A forma como a vida de Britney foi exposta e o rumo que tomou deve fazer-nos refletir sobre diferentes questões, que continuam atuais. Até que ponto, em nome das audiências, se podem explorar as emoções e o sofrimento alheio? Com que direito se fala do aspecto físico de uma mulher quando esta não o consente? Que valores deve representar uma mulher, quem os define e por que são tão diferentes dos que se atribuem a um homem? Em 2022 Britney é uma mulher livre, voltou a tomar as rédeas da sua vida e a inspirar uma legião de fãs por todo o mundo. Quero acreditar que, como ela, somos hoje também mais livres, livres para contar a nossa história e para não permitir que alguém a conte por nós Juntos pela Saúde Mental de Todos Nós, ManifestaMente, Miriam Garrido Comments are closed.
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Novembro 2024
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